É preciso que o mundo não se esqueça de Cabo Delgado | 5MIN #164 | 11MAR23

É uma consequência indirecta da guerra na Ucrânia. Com o mundo de olhos postos no apoio aos ucranianos, outros conflitos passaram para plano secundário e isso está a reflectir-se na ajuda humanitária para milhares de pessoas. A situação em Cabo Delgado, no norte de Moçambique, é um exemplo trágico desta realidade.
Manuel Nota, director da Caritas Diocesana de Pemba, alerta, em entrevista à Fundação AIS, que vai ser difícil alimentar todos os deslocados, cerca de 1 milhão, vítimas do terrorismo que assola a região desde 2017 e que estão a viver em campos de reassentamento.
As suas palavras deviam fazer acender todas as luzes de alarme. Diz ele que recebeu há dias uma chamada da responsável por um dos campos de deslocados a pedir alimentos, mas ele nada pode fazer. Quando os armazéns da Caritas ficam vazios os estômagos dos deslocados ficam vazios.
Com a falta de recursos, que está a afectar profundamente também o Programa Alimentar Mundial, das Nações Unidas, a tendência na Caritas de Pemba é para reduzir o número de projectos e, como consequência, o número de pessoas beneficiadas.
Esse número tem vindo a baixar drasticamente. Em 2021, a organização católica conseguiu prestar apoio, em Pemba, a aproximadamente 120 mil famílias, mas esse número baixou no ano passado para apenas cerca de 50 mil pessoas e a situação agrava-se de dia para dia.
Quase em simultâneo às declarações do responsável da Caritas de Pemba à Fundação AIS, Fátima Castro, uma jovem missionária portuguesa de Braga, presente na comunidade de Ocua, em Cabo Delgado, colocava nas redes sociais o desabafo de uma mãe que tinha caminhado mais de 70 quilómetros com os quatro filhos para pedir alguma coisa para comer.
“Os meus filhos – disse essa mãe – não param de chorar. Têm fome e eu só lhes tenho dado folhas que apanho no campo… não há dinheiro para ir ao mercado. Estamos a ficar doentes…”
Este relato revela o dramatismo da situação. Fátima Castro acrescenta que “há dias em que nem folhas há para enganar a fome”. Com o mundo de olhos postos no apoio aos ucranianos, outros conflitos passaram para plano secundário e isso está a reflectir-se na ajuda humanitária para milhares de pessoas. A situação em Cabo Delgado, no norte de Moçambique, é um exemplo trágico desta realidade. É preciso que o mundo não se esqueça de Cabo Delgado.
Paulo Aido

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